Proclamação do amor antigramática
“Dá-me um beijo”, ela me disse,
E eu nunca mais voltei lá.
Quem fala “dá-me” não ama,
Quem ama fala “me dá”
“Dá-me um beijo” é que é correto,
É linguagem de doutor,
Mas “me dá” tem mais afeto,
Beijo me-dado é melhor.
A gramática foi feita
Por um velho professor,
Por isso é tão má receita
Pra dizer coisas de amor.
O mestre pune com zero
Quem não diz “amo-te”. Aposto
Que em casa ele é mais sincero
E diz pra mulher: “te gosto”
Delírio dos olhos meus,
Estás ficando antipática.
Pelo diabo ou por deus
Manda às favas a gramática.
Fala, meu cheiro de rosa,
Do jeito que estou pedindo:
“Hoje estou menas formosa,
Com licença, vou se indo”.
Comete miles de erros,
Mistura tu com você,
E eu proclamarei aos berros:
“Vós és o meu bem querer”.
LAGO, M. Disponível em: www.mariolago.com.br. Acesso em: 30 out. 2021.
Nesse poema, o eu lírico defende o uso de algumas estruturas consideradas inadequadas na norma-padrão da língua. Esse uso, exemplificado por “me dá” e “te gosto”, é legitimado
A) pelo contexto de situação discutido ao longo do poema.
B) pelas características enunciativas requeridas pelo gênero poema.
C) pela interlocução construída entre o eu lírico e os leitores do poema.
D) pela mobilização da função poética da linguagem na composição do texto.
E) pelo reconhecimento do valor social da variedade de prestígio em textos escritos.
Solução
No poema, o eu lírico questiona as regras formais da gramática no contexto de declarações de amor, defendendo que o afeto e a emoção expressos em uma linguagem mais coloquial são mais importantes que a correção gramatical. O uso de estruturas como “me dá” e “te gosto” é legitimado nesse contexto, pois o eu lírico considera que essas expressões são mais autênticas e carinhosas, adequadas à situação de intimidade e afeto.
Alternativa A