TEXTO I
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um caco de vidro, é a vida, é o sol
É a noite, é a morte, é o laço, é o anzol
É peroba-do-campo, é o nó da madeira
Caingá, candeia, é o matita-pereira
TOM JOBIM. Águas de março. O Tom de Jobim e o tal de João Bosco. (disco de bolso). Salvador: Zen Produtora, 1972. (fragmento).
TEXTO II
A inspiração súbita e certeira do compositor serve ainda de exemplo do lema antigo: nada vem do nada. Para ninguém, nem mesmo para Tom Jobim. Duas fontes são razoavelmente conhecidas. A primeira é o poema O caçador de esmeraldas, do mestre parnasiano Olavo Bilac: “Foi em março, ao findar da chuva, quase à entrada/ do outono, quando a terra em sede requeimada/ bebera longamente as águas da estação […]”. E a outra é um ponto de macumba, gravado com sucesso por J.B. Carvalho, do Conjunto Tupi: “É pau, é pedra, é seixo miúdo, roda a baiana por cima de tudo”. Combinar Olavo Bilac e macumba já seria bom; mas o que se vê em Águas de março vai muito além: tudo se transforma numa outra coisa e numa outra música, que recompõem o mundo para nós.
NESTROVSKI, A. O samba mais bonito do mundo. In: Três canções de Tom Jobim. São Paulo: Cosac Naify, 2004.
Ao situar a composição no panorama cultural brasileiro, o Texto II destaca o(a)
A) diálogo que a letra da canção estabelece com diferentes tradições da cultura nacional.
B) singularidade com que o compositor converte referências eruditas em populares.
C) caráter inovador com que o compositor concebe o processo de criação artística.
D) relativização que a letra da canção promove na concepção tradicional de originalidade.
E) resgate que a letra da canção promove de obras pouco conhecidas pelo público no país.
Solução
No texto II, Nestrovski revela o contexto por trás da canção “Águas de Março” de Tom Jobim, mostrando como o compositor conecta o poema “O caçador de esmeraldas”, de Olavo Bilac, representante da cultura erudita, com elementos de um ponto de macumba da cultura popular negra brasileira. Essa intertextualidade na canção não apenas reflete um diálogo entre tradições, mas sintetiza a essência da cultura brasileira.
Alternativa A