Desde dezoito anos que o tal patriotismo lhe absorvia e por ele fizera a tolice de estudar inutilidades. Que lhe importavam os rios? Eram grandes? Pois que fossem… Em que lhe contribuiria para a felicidade saber o nome dos heróis do Brasil? Em nada… O importante é que ele tivesse sido feliz. Foi? Não. Lembrou-se das coisas do tupi, do folk-lore, das suas tentativas agrícolas… Restava disso tudo em sua alma uma satisfação? Nenhuma! Nenhuma!
O tupi encontrou a incredulidade geral, o riso, a mofa, o escárnio; e levou-o à loucura. Uma decepção. E a agricultura? Nada. As terras não eram ferazes e ela não era fácil como diziam os livros. Outra decepção. E, quando o seu patriotismo se fizera combatente, o que achara? Decepções. Onde estava a doçura de nossa gente? Pois ele não a viu combater como feras? Pois não a via matar prisioneiros, inúmeros? Outra decepção. A sua vida era uma decepção, uma série, melhor, um encadeamento de decepções. A pátria que quisera ter era um mito; um fantasma criado por ele no silêncio de seu gabinete.
BARRETO, L. Triste fim de Policarpo Quaresma. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 8 nov. 2011.
O romance Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, foi publicado em 1911. No fragmento destacado, a reação do personagem aos desdobramentos de suas iniciativas patrióticas evidencia que
A) a dedicação de Policarpo Quaresma ao conhecimento da natureza brasileira levou-o a estudar inutilidades, mas possibilitou-lhe uma visão mais ampla do país.
B) a curiosidade em relação aos heróis da pátria levou-o ao ideal de prosperidade e democracia que o personagem encontra no contexto republicano.
C) a construção de uma pátria a partir de elementos míticos, como a cordialidade do povo, a riqueza do solo e a pureza linguística, conduz à frustração ideológica.
D) a propensão do brasileiro ao riso, ao escárnio, justifica a reação de decepção e desistência de Policarpo Quaresma, que prefere resguardar-se em seu gabinete.
E) a certeza da fertilidade da terra e da produção agrícola incondicional faz parte de um projeto ideológico salvacionista, tal como foi difundido na época do autor.
Solução
No trecho, o personagem demonstra seu patriotismo baseado em símbolos idealizados, como a cordialidade do povo. No entanto, ele se decepciona ao não encontrar esses atributos na realidade, conforme expressa em trechos como “Onde estava a doçura de nossa gente?”. Isso revela a frustração do personagem ao perceber que suas crenças foram construídas sobre mitos e estereótipos irreais sobre o país, resultando em desengano.
Alternativa C