Somente uns tufos secos de capim empedrados crescem na silenciosa baixada que se perde de vista. Somente uma árvore, grande e esgalhada mas com pouquíssimas folhas, abre-se em farrapos de sombra. Único ser nas cercanias, a mulher é magra, ossuda, seu rosto está lanhado de vento. Não se vê o cabelo, coberto por um pano desidratado. Mas seus olhos, a boca, a pele – tudo é de uma aridez sufocante. Ela está de pé. A seu lado está uma pedra. O sol explode.
Ela estava de pé no fim do mundo. Como se andasse para aquela baixada largando para trás suas noções de si mesma. Desapossada e despojada, não se abate em auto acusações e remorsos. Vive.
Sua sombra somente é que lhe faz companhia. Sua sombra, que se derrama em traços grossos na areia, é que adoça como um gesto a claridade esquelética. A mulher esvaziada emudece, se dessangra, se cristaliza, se mineraliza. Já é quase de pedra como a pedra a seu lado. Mas os traços de sua sombra caminham e, tomando-se mais longos e finos, esticam-se para os farrapos de sombra da ossatura da árvore, com os quais se enlaçam.
FROÉS, L. Vertigens: obra reunida. Rio de Janeiro: Rocco, 1998
Na apresentação da paisagem e da personagem, o narrador estabelece uma correlação de sentidos em que esses elementos se entrelaçam. Nesse processo, a condição humana figura-se
A) amalgamada pelo processo comum de desertificação e de solidão.
B) fortalecida pela adversidade extensiva à terra e seres vivos.
C) redimensionada pela intensidade da luz e da exuberância local.
D) imersa num drama existencial de identidade e de origem.
E) imobilizada pela escassez e pela opressão do ambiente.
Solução
O enunciado destaca a fusão entre a personagem e a paisagem, que se misturam simbolicamente, como ilustrado no trecho: “A mulher esvaziada emudece, se dessangra, se cristaliza, se mineraliza. Já é quase de pedra como a pedra a seu lado”. A mulher é descrita como magra e despojada, em uma paisagem igualmente seca e desolada. Essa integração entre personagem e ambiente, ambos marcados pela aridez e solidão, torna evidente a “amálgama” entre a condição humana e a natureza. Assim, a alternativa que utiliza o termo “amalgamada” é a correta, reforçando essa união simbólica entre a mulher e o meio ao seu redor.
Alternativa A