Senhor Juiz
O instrumento do “crime” que se arrola
Nesse processo de contravenção
Não é faca, revólver ou pistola,
Simplesmente, doutor, é um violão.
Será crime, afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores,
Perambular na rua um desgraçado
Derramando nas praças suas dores?
Mande, pois, libertá-lo da agonia
(a consciência assim nos insinua)
Não sufoque o cantar que vem da rua,
Que vem da noite para saudar o dia.
É o apelo que aqui lhe dirigimos,
Na certeza do seu acolhimento
Juntada desta aos autos nós pedimos
E pedimos, enfim, deferimento.
Disponível em: www.migalhas.com.br. Acesso em: 23 set. 2020 (adaptado).
Essa petição de habeas corpus, ao transgredir o rigor da linguagem jurídica,
A) permite que a narrativa seja objetiva e repleta de sentidos denotativos.
B) mostra que o cordel explora termos próprios da esfera do direito.
C) demonstra que o jogo de linguagem proposta atenua a gravidade do delito.
D) exemplifica como o texto em forma de cordel compromete a solicitação pretendida.
E) esclarece que os termos “crime” e “processo de contravenção” são sinônimos.
Solução
O suposto crime envolvia um violão como “arma”, e o defensor, por não considerar o ato um delito sério, optou por uma defesa em forma de repente. Ele destacou como a música e a linguagem podem suavizar o rigor do sistema jurídico e mitigar a punição. Mesmo sendo um gênero tradicionalmente rígido em termos de linguagem, a petição mistura termos jurídicos precisos com a linguagem poética do cordel, exemplificado em frases como “Derramando nas praças suas dores?” e “libertá-lo da agonia”. A musicalidade presente no ritmo e nas rimas dá ao ato de tocar violão um tom menos grave.
Alternativa C