Introdução a Alda
Dizem que ninguém mais a ama. Dizem que foi uma boa pessoa. Sua filha de doze anos não a visita nunca e talvez raramente se lembre dela. Puseram-na numa cidade triste de uniformes azuis e jalecos brancos, de onde não pôde mais sair. Lá, todos gritam-lhe irritados, mal se aproxima, ou lhe batem, como se faz com sacos de areia para treinar os músculos.
Sei que para todos ela já não é, ninguém lhe daria uma maça cheirosa, bem vermelha. Mas não é verdade que alguém não a possa mais amar. Eu amo-a. Amo-a quando a vejo por trás das grades de um palácio, onde se refugiou princesa, chegada pelos caminhos da dor. Quando fora do reino sente o mundo de mil lanças, e selvagem prepara-se, posta no olhar. Amo-a quando criança brinca na areia sem medo. Uns pés descalços, uma mulher sem intenções. Cercada de mundo, às vezes sofrendo-o ainda.
CANÇADO, M. L. O sofredor do ver. Belo Horizonte: Autêntica, 2015.
Ao descrever uma mulher internada em um hospital psiquiátrico, o narrador compõe um quadro que expressa sua percepção
A) irônica quanto aos efeitos do abandono familiar.
B) resignada em facce dos métodos terapêuticos em vigor.
C) alimentada pela imersão lírica no espaço da segregação.
D) inspirada pelo universo pouco conhecido da mente humana.
E) demarcada por uma linguagem alinhada à busca da lucidez.
Solução
O narrador se coloca no lugar de Alda, enxergando-a por meio de suas ações, como uma “princesa” ou “criança.” Esse olhar do narrador confere à descrição da mulher abandonada em um hospital psicanalítico uma perspectiva carregada de simbolismos e ressignificação.
Alternativa C