Você vende uma casa, depois de ter morado nela durante anos; você a conhece necessariamente melhor do que qualquer comprador possível. Mas a justiça é, então, informar o eventual comprador acerca de qualquer defeito, aparente ou não, que possa existir nela, e mesmo, embora a lei não obrigue a tanto, acerca de algum problema com a vizinhança. E, sem dúvida, nem todos nós fazemos isso, nem sempre, nem completamente.
Mas quem não vê que seria justo fazê-lo e que somos injustos não o fazendo? A lei pode ordenar essa informação ou ignorar o problema, conforme os casos; mas a justiça sempre manda fazê-lo.
Dir-se-á que seria difícil, com tais exigências, ou pouco vantajoso, vender casas… Pode ser. Mas onde se viu a justiça ser fácil ou vantajosa? Só o é para quem a recebe ou dela se beneficia, e melhor para ele; mas só é uma virtude em quem a pratica ou a faz.
Devemos então renunciar nosso próprio interesse? Claro que não. Mas devemos submetê-lo à justiça, e não o contrário. Senão? Senão, contente-se com ser rico e não tente ainda por cima ser justo.
COMTE-SPONVILLE, A. Pequeno tratado das grandes virtudes. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
No processo de convencimento do leitor, o autor desse texto defende a ideia de que
A) o interesse do outro deve se sobrepor ao interesse pessoal.
B) a atividade comercial lucrativa é incompatível com a justiça.
C) a criação de leis se pauta por princípios de justiça.
D) o impulso para a justiça é inerente ao homem.
E) a prática da justiça pressupõe o bem comum.
Solução
O autor, André Comte-Sponville, no texto, argumenta que a prática da justiça exige que o interesse pessoal seja submetido ao que é justo, ainda que isso possa não ser fácil ou vantajoso para quem pratica a justiça. Ele deixa claro que a justiça não é sobre vantagens para quem a exerce, mas sobre beneficiar o outro, e que ser justo pode significar abrir mão de parte do interesse próprio.
Alternativa E